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domingo, 1 de setembro de 2013

Semiologia I: Endocrinologia

CURIOSIDADE:

Quais são esses sinais e representam em conjunto qual doença?




DOENÇA DE GRAVES:

1) Oftalmopatia de Graves:

Essa condição é também denominada oftalmopatia associada à tireoide, visto que ocorre na ausência de Doença de Graves em 10% dos pacientes. Dessa última parte a maioria exibe hipotireoidismo autoimune ou é portador de anticopos tireoidianos.
Está presente em 20-40% dos casos de Doença de Graves. Os sinais mais frequentes da oftalmopatia são a retração palpebral e o edema periorbitário. Embora um menor grau de retração palpebral (1-2 mm) possa dever-se a hiperatividade simpática e, portanto, ocorrer em qualquer causa de hipertireoidismo, é provável que uma retração mais marcante se deva à oftalmopatia de Graves. Outros sinais são o edema e hiperemia conjuntival, exoftalmia ou proptose bilateral (aumento do tecido retrobulbar) e a diplopia (inflamação e edema dos músculos extraoculares em 5 a 10%). Raramente, pode ocorrer a compressão do nervo óptico no ápice da órbita que pode provocar defeitos visuais.

2) Dermopatia Tireoidiana:

É encontrada em menos de 5% dos pacientes, geralmente em associação com oftalmopatia moderada a grave e acropatia. A lesão é descrita como mixedema pré-tibial, graças ao acúmulo de glicosaminoglicanos. Apresenta-se em placas e o aspecto é em “casca de laranja”, porém com colaração violácea. Apesar de serem mais frequentes na sobre as superfícies anterior e lateral da perna, as alterações cutâneas podem ocorrer em outros locais, particularmente após traumatismos. Pode haver um comprometimento extenso, simulando elefantíase.

3) Acropatia Tireoidiana:

Pode ser encontrada em 1% dos pacientes e é representada pelo baqueteamento digital. Está fortemente correlacionada com a dermopatia. Caso não haja correlação deve-se procurar por outras causas de hipocratismo digital como DPOC, cirrose hepática, cardiopatias congênitas cianóticas, neoplasias malignas pulmonares.

4) Unhas de Plummer:

Caracterizadas pelo deslocamento da porção distal da unha do leito ungueal.

Referências Bibliográficas:

NEVES, C.; ALVES, M.; DELGADO, J. L.; MEDINA, J. L. Doença de Graves. Arquivos de Medicina, v. 22, n. 4/5, p. 137-146, 2008.
HARRISON, T. R.; LONGO, D. L. Harrison: medicina interna. 18. ed. Porto Alegre: AMGH Ed., 2013.


CASO CLÍNICO IV:

Identificação: 21 anos, feminino, branca, solteira, natural e residente de Curitiba-PR, operária fabril.
QP: “Fraqueza”
HMA: Paciente iniciou há dois meses quadro de astenia associado a emagrecimento com anorexia de 5kg (62kg para 57kg), fraqueza ao levantar, depressão, perda da libido, vômitos 2x/semana, febre baixa, geralmente de 37,8°C, dor abdominal difusa, de caráter inespecífico, de moderada intensidade, de duração intermitente, sem fator de alívio ou de piora. Nega tosse, sudorese noturna, dispneia, alteração nos hábitos intestinais.
HMP: Nega doenças na infância, operações e internamentos anteriores. Nega TB anterior, doenças auto-imunes e outras morbidades. Nega uso de medicamentos contínuos.
HMF: Pai vivo, 55 anos, hipertenso. Mãe viva, 51 anos, sem morbidades. Nega história de Câncer na família.
CHV: Nega hábitos alcoólicos, tabagismo e tóxicos. Nega casos próximos de tuberculose.
RS: Pele: escurecimento de pregas palmares e lábios.

EXAME FÍSICO:

Geral: Paciente emagrecida em REG, LOTE, anictérica, desidratada (++/4+), normocorada. PA sentada: 100/60mmHg; em pé: 65/40mmHg; pulso: 110bpm; FR: 16rpm; T: 36,2°C.
Pele: Seca e ausência de lesões. Perda dos pelos axilares. Hiperpigmentação de pregas palmares.
C/P: Conjuntivas normocoradas, escleras anictéricas, línguas papiladas, vasos sublinguais finos, hiperpigmentação de lábios e mucosa oral. Ausência de linfonodomegalias.  Jugulares não ingurgitadas.
CPP: MV presentes bilateralmente e simétricos, sem RA.
ACV: Bulhas cardíacas taquicárdicas normofonéticas sem sopros.
Abdômen: globoso, flácido, RHA presentes. Ausência de dor ou massas a palpação superficial e profunda e a descompressão brusca. Baço e fígado não palpáveis.

EXAMES COMPLEMENTARES:

Hemoglobina: 12.8g/dl
Leucócitos: 7.400
·         Eosinófilos 11% (N: 40-600)
·         Basófilos 0% (N: 0-100)
·         Linfócitos 44% (N: 1500-3500)
·         Monócitos 4% (N: 200-900)
·         Segmentados: 39% (N: 2500-7500)
·         Bastões: 2% (0-900)
Plaquetas: 264.000 (N: 120.000-400.000)
VHS: 11 mm (N 0-10 mm)
Proteína C: negativa
Sódio: 130 mmol/L (N: 135-145)
Potássio: 6.8 mmol/L (N: 3,5-5,3)
Cálcio, magnésio, fósforo normais
Provas de função hepática, creatinina, ureia, coagulação, glicemia de jejum normais.
Parâmetros plasmáticos endócrinos:
·         ACTH: 2302.0 pg/ml (N: 7.0-51);
·         Cortisol (manhã e tarde): <0.2 mg/dl (N: 4.3-22.4);
·         Aldosterona: indetectável (N: 10-160 pg/ml);
·         Renina: 969.0 pg/ml (N: 3.6-20.1pg/ml)
·         TSH: 3,2 (N: 0,3-3)
·         T4L: 0,7 (N: 0,6-1,8)
HbsAg, anti-HIV, anti-CMV e VDRL negativos.
BK no suco gástrico e urina: negativos
PPD: negativo
Ecografia abdominal e a radiografia do tórax: normais.
TAC de abdômen: atrofia bilateral das adrenais sem lesões expansivas ou calcificações.

Qual o provável diagnóstico?

Qual o motivo para hiperpigmentação?

RESPOSTA AO CASO CLÍNICO IV:

O diagnóstico é doença de Addison ou insuficiência adrenal primária. As principais causas dessa doença são adrenalite autoimune e tuberculose. No entanto, a principal causa de insuficiência adrenal é a forma secundária (ACTH baixo) decorrente do uso crônico de glicocorticoides exógenos.
As suprarrenais são as glândulas endócrinas mais frequentemente acometidas em pacientes com SIDA, pois o envolvimento pode ser decorrente de infecções oportunistas (TB, CMV, micobactérias atípicas, micoses), drogas (rifampicina, cetoconazol) e a lesões metastáticas (sarcoma de Kaposi, linfomas).
O Paracoccidioides brasilienses tem sido observado em regiões brasileiras onde esta micose é endêmica (no Paraná inclusive). Existem outras causas como hiperplasia adrenal congênita, adrenoleucodistrofia e síndromes poliglandulares autoimunes.
As manifestações clínicas da insuficiência adrenal primária baseiam-se na deficiência dos hormônios. A deficiência de glicocorticoides (astenia, perda de peso, anorexia, náuseas e vômitos, hipotensão arterial); mineralocorticoides (avidez por sal, hipovolemia, hipotensão, hipotensão ortostática, hiponatremia, hipercalemia e acidose metabólica leve) e androgênios (amenorreia, redução da pilificação axilar e corporal, diminuição da libido nas mulheres). Sintomas psiquiátricos podem estar presentes como depressão, psicose, alteração de memória e confusão mental. As manifestações inicias da doença geralmente são náuseas, vômitos, anorexia com perda ponderal e dor abdominal que pode ser tão intensa a ponto de simular abdômen agudo.
A hiperpigmentação cutaneomucosa é um achado clássico do exame físico na doença de Addison, uma vez que decorre do excesso de ACTH, beta lipotrofina e, possivelmente, beta MSH, todos componentes da molécula precursora POMC. Esse excesso leva a estimulação dos melanócitos. Pode ser generalizada ou notada somente em torno dos lábios, gengiva, linhas da palma da mão, leito ungueal, mamilos, em áreas expostas ao sol e sujeitas ao trauma. As cicatrizes após a instalação da doença também tornam-se pigmentadas.

Os achados laboratoriais inespecíficos auxiliam muito na suspeita diagnóstica. Como hiponatremia, hipercalemia, tendência à hipoglicemia, além de anemia normocítica normocrômica, eosinofilia, lincocitose relativa e uma discreta neutropenia. A hipoglicemia é incomum, mas pode acometer indivíduos expostos a várias horas de jejum e infecções. Já os testes mais específicos são os testes hormonais, a princípio deve-se utilizar a dosagem de cortisol basal das 8h, sendo: um valor menor que 10µg/dL muito sugestivo; um valor inferior a 3-5µg/dL quase patognomônico; níveis superiores a 18-20µg/dL tornam o diagnóstico improvável. Para níveis intermediários é necessária a realização do teste de estímulo com ACTH. Se após administração de ACTH, ocorrer um pico de cortisol < 18-20µg/dL confirma o diagnóstico. Na doença de Addison, o ACTH excede o limite superior do normal e usualmente está acima de 200 pg/mL. Além disso, pode realizar a dosagem de anticorpos anticórtex adrenal (ACA), sendo a enzima 21-hidroxilase o principal antígeno desses anticorpos. O TSH pode estar ligeiramente elevado, devido ao fato do cortisol participar do feedback negativo desse hormônio.

José Vitor Martins Lago


2 comentários:

  1. Considerando a hiperpigmentação cutânea um sintoma-guia, poderiamos pensar em afecções que geram este quadro. Dentre elas, o distúrbio que tem associado fraqueza, emagrecimento, hipotensão postural,hiponatremia e hiperpotassemia, cortisol baixo e ACTH aumentado pode ser a Insuficiência Adrenal primária.

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