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Monitores 2013.2

domingo, 25 de agosto de 2013

Semiologia I

CURIOSIDADE:

Qual é a alteração apresentada? Está relacionada com o quê?






A acanthosis nigricans (AN) é um termo utilizado para descrever zonas espessadas (acantose = hiperplasia do estrato espinhoso da epiderme) e hiperpigmentadas da pele, que afetam mais frequentemente áreas de flexuras (axilas, dobras cutâneas do pescoço e regiões inguinais e anogenitais). É um marcador cutâneo de afecções cutâneas e malignas associadas e, portanto, pode ser dividido em dois tipos. O tipo benigno, que constitui cerca de 80% de todos os casos, desenvolve-se de forma gradual, normalmente, acontece na infância ou puberdade. Pode ocorrer (1) como herança autossômica dominante, com penetrância variável, (2) em associação a obesidade ou a endocrinopatias (principalmente tumores hipofisários e diabetes tipo II) e (3) como parte de algumas síndromes genéticas raras (Síndrome de Bloom, Síndrome de Alstrom). Contudo, pode ser manifestação paraneoplásica, principalmente de adenocarcinomas de TGI, particularmente CA gástrico. É raro a apresentação em outros lugares do corpo, porém, quando atingem superfície palmar e plantar é típico de CA gástrico.
A distinção de AN paraneoplásica torna-se facilitada pela exuberância com que se manifesta, a extensão e a intensidade das lesões são maiores nesse subtipo, sendo o prurido, incomodativo, a principal queixa do paciente; é uma situação que é recorrente ao contrário das outra forma. As mucosas são mais afetadas nessa forma maligna. Pode associar-se ao Sinal de Leser-Trélat (verrugas seborreicas múltiplas, de aparecimento rápido e acompanhadas de prurido).
O mecanismo proposto para o aparecimento de AN é a excessiva estimulação de queratinócitos e fibroblastos cutâneos através da ativação de receptores de fatores de crescimento insulínico (IGF-1) existentes nessas células. Como a insulina e o IGF-1 apresentam estruturas homólogas, na presença de grandes concentrações de insulina existirá uma reação cruzada entre essa substância e os receptores de IGF-1, com hiperqueratose subsequente, explicando o aparecimento dessa patologia em estados hiperinsulinêmicos. O mesmo há com o aumento do GH, que estimula o IGF-1. Contudo, na síndrome paraneoplásica o mecanismo suposto é a produção de fatores de crescimento tumorais com capacidade de estimulação de IGF-1 como TGF alfa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ROSÁRIO, F.; CALDEIRA, J. Acanthosis Nigricans revisitada. Medicina Interna, v. 8, n. 4, p. 217-221, 2001.
ROBBINS, Stanley L.; COTRAN, Ramzi S.; KUMAR, Vinay; COLLINS,Tucker. Patologia: estrutural e funcional. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000.    

CASO CLÍNICO III:

ANAMNESE:

Identificação: 20 anos, masculino, caucasiano, natural e residente de Curitiba-PR, estudante.
QP: “Emagrecimento”
HMA: Paciente iniciou quadro de emagrecimento de 10 kg em um mês, de 66 kg para 56 kg, sem anorexia. Relata também há 1 mês quadro diarreico com 10 evacuações por dia, de odor rançoso, em moderada quantidade, de duração contínua surgindo igualmente tanto de dia quanto à noite, sem sangue, muco ou pus, mas com restos alimentares. Apresenta associado dor em cólica, difusa, principalmente em região periumbilical, intermitente sem alívio após evacuação. Nega puxo e tenesmo. Refere dores articulares bilateralmente em joelhos e tornozelos, sem sinais flogísticos, edema de MMII e distensão abdominal. Nega febre, uso anterior de antibióticos, úlceras orais, lesões de pele, alterações oculares e cutâneas, disúria, poliúria, polidipsia, agitação, sudorese, insônia, palpitações.
HMP: Nega operações, internamentos, uso de medicamentos e alergias. Nega DM, HAS e doenças auto-imunes.
HMF: Mãe viva, 48 anos, sem morbidades. Pai vivo, 52 anos, hipertenso. Irmãos são saudáveis.
CHV: Alimentação balanceada, ingere todos tipos de alimentos. Nega tabagismo, etilismo ou tóxicos. Nega viagens anteriores ao quadro e conhecidos com sintomatologia semelhante.
RS: sp.

EXAME FÍSICO:

Geral: Paciente emagrecido, LOTE, anictérico, desidratado (+/4+), hipocorado (+/4+). PA: 110-80mmHg; Pulso: 80 bpm; FR: 16 rpm; T: 36,2°C.
Pele: Ausência de lesões, pele e mucosas secas.
C/P: Conjuntivas hipocoradas (+/4+), escleras anictéricas, língua despapilada, vasos sublinguais parcialmente cheios. Ausência de linfonodomegalia. Tireoide palpável, com características normais. Jugulares não ingurgitadas.
CPP: MV + bilateralmente e simétricos, sem RA.
ACV: BCRNFSS.
Abdômen: distendido, flácido, com RHA aumentados. Som timpânico a percussão, espaço de Traube livre e hepatimetria de 6 cm em LHCD. Ausência de massas, dor difusa leve a palpação do abdômen. Ausência de dor a descompressão rápida.
MMII: Pernas edemaciadas bilateralmente com cacifo.

EXAMES COMPLEMENTARES:

Hb: 10,7 g/Dl
Ht: 33,3 %
VCM: 76 fl (80-100)
HCM: 26 pg (27-33)
CHCM: 30 g/dL (33-35)
Leucócitos: 4.320 (4.000-11.000)
Plaquetas: 273.000 (120.000-400.000)
VHS: 40mm/1ª hora
PCR: reagente
Albumina: 2,8g/dL (3,5-5,0)
Sorologias para hepatite B, C, HIV, CMV e HSV não reagentes.
Exame parasitológico das fezes: normal.
Alfa 1-antitripsina nas fezes: elevada 
Anticorpos Anti-gliadina: normal
Anticorpos Anti-transglutaminase: elevados
Glicose em jejum, ureia, creatinina, bilirrubinas e transaminases normais.

Qual o diagnóstico sindrômico e o etiológico?

Quais os principais diagnósticos diferenciais?

Qual o próximo passo para confirmação diagnóstica?


RESPOSTA AO CASO CLÍNICO III:

O diagnóstico sindrômico é síndrome consumptiva sem diminuição do apetite. Essa perda de 10kg em um mês, então, direciona a 3 causas: hipertireoidismo, diabetes mellitus tipo 1 ou síndrome disabsortiva.
Sabendo que o paciente apresenta um quadro diarreico crônico alto por certas características como odor rançoso das fezes, cólica difusa sem alívio após evacuação e ausência de sangue, muco ou pus, além de negar puxo e tenesmo. Normalmente, a diarreia alta apresenta menos frequência e é mais volumosa que a diarreia baixa. Portanto, deve-se pensar em alguma causa diarreica alta.
Associado a diarreia, também relatava edema de MMII, distensão abdominal e dor articular. Existem diversas causas de artralgia e diarreia, entre elas estão: doença de Whipple, DII (geralmente artrite) e outras doenças autoimunes, por exemplo, doença celíaca. É importante ressaltar o significado dos “nega”, como uso anterior de ATB (clostridium difficile, causa de diarreia aguda com colite pseudomembranosa, geralmente após uso de amoxicilina), febre (infecção), úlceras orais (Crohn, LES), lesões de pele (dermatite herpetiforme para doença celíaca; eritema nodoso e pioderma gangrenoso para DII, a primeira mais comum em Crohn e a segunda em RCU); polidipsia, poliúria (DM tipo 1); sudorese, agitação, insônia, palpitações (hipertireoidismo) e alterações oculares (DII); viagens e quadro semelhante em conhecidos (infecções).
Partindo disso, no exame físico, encontrou-se uma tireoide de aspecto normal, língua despapilada (anemia carencial), edema de MMII com cacifo e abdômen distendido, além dos sinais de desidratação. Nos exames complementares, glicemia de jejum normal, anemia hipocrômica e microcítica, provas inflamatórias positivas sem leucocitose, alfa 1-antitripsina elevada nas fezes (perda proteica pelo intestino) e anticorpo antitransglutaminase tecidual positiva. Logo, o provável diagnóstico etiológico é doença Celíaca. E o próximo passo é a EDA com biópsia de duodeno, sendo confirmado o diagnóstico, deve ser feita a restrição alimentar ao glúten.
A doença celíaca é uma enteropatia autoimune, induzida pela ingestão de glúten presente no trigo, centeio, cevada e em menor proporção na aveia, estando subjacente uma predisposição genética. A grande maioria dos pacientes expressa anticorpos contra a enzima transglutaminase tecidular. Outrora considerada uma patologia limitada à população pediátrica, o espectro variado de manifestações clínicas da doença é hoje melhor conhecido e, graças aos avanços nas técnicas de diagnóstico, é atualmente possível detectar a doença celíaca em adultos com formas de apresentação atípicas ou oligossintomáticas. As complicações mais graves são o desenvolvimento de neoplasias, nomeadamente linfomas.
O quadro clínico nos adultos é dividido em sintomas gastrointestinais e manifestações extraintestinais.  As fora do intestino são: anemia ferropriva, diminuição da densidade mineral óssea, fadiga crônica, infertilidade, aumento das transaminases, dermatite herpetiforme, artralgias, deficiência de folato/zinco e sintomas neurológicos (predominantemente neuropatia periférica e ataxia). Os sintomas gastrointestinais mais frequentes são a dor abdominal, geralmente de tipo cólica, a distensão abdominal intermitente, dispepsia e alterações dos hábitos intestinais. A diarreia não é um sintoma obrigatório e até 50% dos doentes adultos apresentam obstipação como forma predominante.
A Dermatite herpetiforme (DH) é uma manifestação cutânea caracterizada pela presença de lesões papulovesiculares pruriginosas nos joelhos, cotovelos, ancas e costas que ocorre em 10 a 20% dos doentes celíacos.
A prevalência de DC em diabéticos tipo 1 foi extensamente investigada e situa-se entre os 5-6%. Existem também fortes evidências do aumento da prevalência de doença celíaca em crianças com doença tiroideia, doença hepática autoimune, deficiência seletiva de IgA (prevalência de DC 10 a 20 vezes superior à da população geral) e algumas cromossomopatias (Síndrome de Down, Síndrome de Turner e Síndrome Williams).
Os testes sorológicos mais sensíveis e específicos para a doença celíaca são os anticorpos do tipo Imunoglobulina A: anti-endomísio (IgA anti-EMA mais específico) e anti-transglutaminase tecidular (IgA anti-tTG mais sensível). Por isso, é indicado para rastreamento o IgA anti-tTG. Os anticorpos anti-gliadina são úteis para crianças menores de 2 anos, pois são os primeiros a aparecer. Em adultos possuem níveis de sensibilidade e especificidade menor que o IgA anti-tTg. 
Referências Bibliográficas:

MACHADO, A. S. ET AL. Doença celíaca no adulto: a propósito de um caso clínico. J Port Gastrenterol, v. 13, p. 139-143, 2006.

TEXEIRA, N. F. G. Doença Celíaca Atualizada, 2012.


José Vitor Martins Lago




2 comentários:

  1. Poderia ser uma síndrome de má absorção intestinal levando em conta a diarréia, perda de peso e a anemia que o paciente apresenta. O que me chama a atenção é a dor articular em paciente jovem.Seria algo inflamatório talvez?

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  2. Boa hipótese diagnóstica, síndrome de má absorção intestinal por uma doença auto-imune que os anticorpos podem fazer reação cruzada com outros tecidos do corpo, por exemplo, o colágeno da articulação. Confira a resposta!

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