Novo Modelo

A partir de agora os casos clínicos serão organizados por categorias em "marcadores". Basta fazer a busca ou clicar nos links para que sejam exibidos todos os posts que foram marcados pelos redatores como pertencendo a uma categoria. As categorias principais serão Propedêutica 1, Propedêutica 2, Semiologia 1, Semiologia 2 e Casos Clínicos. Também poderão ser buscados pelo assunto das aulas.


Monitores 2013.2

domingo, 11 de agosto de 2013

Semiologia I: Hematologia

CURIOSIDADE:

O que é pica? Qual a origem do termo?

Pica é definida como a ingestão persistente de substâncias não nutritivas, ou seja, a perversão alimentar como exemplos mais clássicos terra ou argila (geofagia) e gelo (pagofagia). Dentre os fatores etiológicos desse transtorno, estão a deficiência de ferro e zinco. 
Pássaro Pega ou Pica no latim.
A palavra pica deriva do nome em latim do pássaro pega (magpie, em inglês), notório pelo hábito de reunir objetos variados em seu ninho para saciar sua fome. Pássaro de hábitos alimentares peculiares caracteriza-se por não discriminar substâncias nutritivas de não nutritivas.
A pica tem sido relatada desde o século V a.C., quando Aristóteles e Hipócrates descreveram a pica e orientavam a respeito do suposto perigo em ingerir gelo. Nessa mesma época, o médico romano Soranus descreveu a pica como um alívio aos desejos e sintomas gestacionais, que se iniciam no 40º dia da gravidez. O primeiro caso documentado de pica refere-se a uma gestante que ingeria terra e foi descrito por Aetius, médico da corte de Justiniano I de Constantinopla. No século X, Avicena, considerado o “Príncipe dos Médicos”, orientava que deficiências nutricionais que poderiam levar a comportamentos de pica poderiam ser supridas se o ferro fosse embebido no vinho. No século XVIII, ao divulgar que comia argila, o sultão do Império Otomano disseminou o costume entre europeus, que o adotaram, acreditando ser essa uma prática saudável.

Referência Bibliográfica:
KACHANI, A. T.; CORDÁS, T. A. Da ópera-bufa ao caos nosológico: pica. Rev Psiq Clín, v. 36, n. 4, p. 162-9, 2009.


CASO CLÍNICO I:

ANAMNESE

ID: D.Z.D, 54 anos, feminino, branca, natural e residente de Curitiba-PR, doméstica.
QP: “Cansaço e dificuldade para engolir”
HMA: Paciente iniciou astenia há 3 anos, de duração constante e de grande intensidade com piora progressiva nos últimos 3 meses. Refere também dispneia aos médios esforços, sem ortopneia, palpitações de curta duração pelo menos uma vez ao dia e ingestão de gelo frequentemente. Nega pirose ou dor epigástrica, regurgitação, melena, hematoquezia e alteração no hábito intestinal.
Afirma também disfagia há 1 ano, localizada em base de pescoço, inicialmente para líquidos e posteriormente para alimentos sólidos, de duração intermitente com períodos de remissão de até 1 semana, com piora no último mês sem fator de alívio. Como sintomas associados refere emagrecimento com anorexia de 4 kg em 6 meses. Nega odinofagia, fraqueza muscular proximal, artralgias, febre, fenômeno de Raynauld e fotossensibilidade.
HMP: Nega operações e internamentos anteriores. Em uso de enalapril 10 mg/dia para HAS. Nega DM, reumatismo e dislipidemia. Nega também alergias e transfusões. Menopausa há 5 anos.
HMF: Pai faleceu aos 85 de IAM. Mãe aos 66 anos de AVE. Nega reumatismo ou câncer na família.
CHV: Nega hábito de chimarrão ou bebidas quentes, alimentação balanceada, contudo em pequena quantidade. Nega tabagismo e etilismo.
RS: sp.

EXAME FÍSICO:

GERAL: BEG, LOTE, anictérica, hidratada, hipocorada (++/4+). PA: 120-85 mmHg; pulso: 108 bpm; FR: 28 rpm; T: 36,6°C.
PELE: Palidez de pele e mucosas. Presença de queilite angular, moderada alopécia, unhas quebradiças e coilinóquia.
C/P: Escleras anictéricas, conjuntivas hipocoradas (++/4+), amplitude normal de abertura da boca, língua despapilada, vasos sublinguais cheios. Traqueia móvel e centrada, tireoide normal. Ausência de linfonodomegalia. Jugulares não ingurgitadas.
CPP: MV + bilateralmente e simétricos sem RA.
ACV: BCRNFSS
ABDÔMEN: globoso, flácido com RHA presentes. Hepatimetria de 7 cm em LHCD. Espaço de Traube livre. Som timpânico a percussão. Ausência de dor ou visceromegalia a palpação superficial e profunda.

EXAMES COMPLEMENTARES:

Hemácias: 4.060.000/L
Leucócitos: 5.600
Plaquetas: 595.000
Hb: 8.2 g/dL
VCM: 77 fL
HCM: 25 pg
CHCM: 30 g/dL
Perfil do Ferro:
Ferro sérico: 25 (50-150)
Capacidade total de ligação ao ferro (TIBC): 400 (300-360)
IS: 10% (20-50%)
Ferritinina: 4 (12-150)

Qual provável diagnóstico?


Quais as principais hipóteses diagnósticas para disfagia?


RESPOSTA AO CASO CLÍNICO I:

O diagnóstico é anemia ferropriva com presença de sintomas e sinais clássicos como: astenia, dispneia aos esforços, palpitações, pica (ingestão de gelo) muito característica desse tipo de anemia, palidez cutâneo-mucosa, glossite atrófica, queilite angular, unhas quebradiças, coilinóquia (unha em colher) e alopecia. É importante sempre tentar buscar a causa base da anemia ferropriva. Na idade da paciente (pós-menopausa) sempre pensar em sangramentos do TGI como esofagite, gastrite ou úlcera e câncer de cólon. Mesmo negando sintomas específicos associados a essas doenças, é necessário realizar uma colonoscopia, pois câncer de cólon direito ou de ceco são silenciosos e assintomáticos. Em mulheres na pré-menopausa considerar hipermenorreia e crianças e adolescentes demanda aumentada pelo crescimento ou sangramento GI por parasitas.
Nos exames laboratoriais, percebe-se uma anemia microcítica e hipocrômica, dando a possibilidade de quatro causas: ferropriva, doença crônica, talassemia ou sideroblástica. O principal diagnóstico diferencial é com anemia de doença crônica, produtoras de IL-1, IL-6, TNF como doenças infecciosas/inflamatórias crônicas ou neoplasias. Nesse caso, o perfil de ferro as diferencia. Na anemia ferropriva há uma diminuição no ferro sérico, índice de saturação, ferritina e aumento na TIBC, pois como não há ferro no organismo, logo a capacidade de ligação total ao mesmo está aumentada. Em 15% dos pacientes há trombocitose.
Por fim, a disfagia da paciente leva nos a pensar na síndrome de Plummer-Vinson ou Pateson-Kelly, que sempre deve ser suspeitada no paciente com anemia intensa com dificuldade para deglutir. É caracterizada pela tríade: disfagia alta associada a diafragma hipofaríngeo (membrana esofágica) e anemia ferropriva.  Sendo necessários exames como EDA ou estudo radiográfico do esôfago para confirmá-la. Geralmente não resolve com a correção da anemia ferropriva, necessitando de terapia endoscópica. É necessário afastar também diagnósticos diferenciais como dermato/polimiosite (disfagia alta), esclerodermia (disfagia baixa) ou até mesmo CA de esôfago

José Vitor Martins Lago

2 comentários:

  1. Anemia de caráter hipo/micro, possivelmente ferropriva (presença de malásia e coiloníquia). Necessidade de se investigar sangramentos e ciclo menstrual. Hipóteses para disfagia???

    ResponderExcluir
  2. Isso aí Marcos, anemia ferropriva mesmo pelo perfil do ferro, ferro sérico baixo, índice de saturação da transferrina baixo, ferritina baixa e capacidade total de ligação alta (já que não tem ferro, tem bastante lugar para ligação). Pensar em sangramento do trato digestivo principalmente, já que ela está menopausada. A resposta da disfagia estará aqui domingo. Abraço.

    ResponderExcluir